segunda-feira, 1 de junho de 2009

Entendimento e segmentação de consumidores - o caso da Eurodisney

Um dos casos mais estudados e debatidos em faculdades de administração é o caso da Eurodisney. Infelizmente para os adoradores do Mickey & Cia, o motivo de tamanho interesse nesse caso é o grande fracasso do seu modelo de negócio. Erguido nos arredores de Paris depois de uma disputa acirrada com outros paises europeus, depois de milhões de euros investidos em transporte, infraestrutura, divulgação, etc, o megaemprendimento só trouxe dores de cabeça aos seus idealizadores. Inaugurado em 1992, o complexo de entretenimento nunca conseguiu sair do vermelho, e sempre esteve bem abaixo de suas metas de desempenho originais. Porém o que poucos sabem é que no ano passado a Eurodisney foi a atração turística mais visitada de toda a Europa com mais de 15 milhões de visitantes. Esse número é maior que a soma dos visitantes do Museu do Louvre e da Torre Eiffel. Surpreso? O mais interessante é que por detrás desses momentos antagônicos da Eurodisney podemos tirar importantes lições sobre o entendimento e a segmentação de consumidores.
Vamos aos fatos. Quando foi idealizado no final dos anos 80, a Eurodisney deveria seguir a mesma formula de sucesso dos parques da Disney nos EUA: atrações espetaculares, hotéis temáticos, e consumo, muito consumo. Os frequentadores da Disney americana deixam milhares de dólares em hospedagem, lanches, bonecos de pelúcia e tranqueiras com orelhinhas do Michey. Logo nos primeiros meses de funcionamento os gestores da Eurodisney perceberam - da pior forma possível - que esse não era o perfil do visitante europeu. Esse último preferia se hospedar em Paris ao invés de ficar em caríssimos hotéis temáticos dentro do parque, muitas vezes levava lanches de casa ao invés de comer nos restaurantes do complexos, e principalmente não tinha a fúria consumista dos americanos para bichos de pelúcia e souvenirs em geral. Outras falhas graves também podem ser citadas: a não disponibilidade de vinhos e cervejas nos restaurantes do parque (fundamentais para franceses e italianos nas refeições), a proibição do uso de bigodes e barbas pelos funcionários, a profunda queda de visitantes nos meses do inverno... Todos esses fatos quase levaram ao fechamento da Eurodisney, e demonstraram a total ignorância sobre o comportamento do consumidor europeu.
Em 2005 os executivos da Eurodisney resolveram finalmente entender os consumidores europeus para buscar formas de aumentar a atratividade do parque, que estava com as visitas estagnadas em torno de 11 milhões de pessoas por ano até 2004. Fizeram então um estudo profundo do mercado europeu que acabou dando origem a diversos segmentos com características diferentes entre sí. Dentro desses segmentos, um acabou chamando atenção dos executivos da Eurodisney: eram famílias que já haviam visitado o parque, tinham adorado a experiência, mas não planejavam voltar. Esse segmento foi chamado de "Disney Family". Devido ao seu elevado potencial de consumo e facilidade de atração (já que eles conheciam o parque e haviam gostado), esse segmento tornou-se o principal foco das atividades de marketing da Eurodisney . Para trazer esses consumidores de volta anualmente, decidiu-se criar um tema especial todos os anos, que em conjunto com algumas atrações novas, tornariam a experiência de visita algo inédito e exclusivo. Uma visita em uma ano nunca seria igual ao do ano anterior (em 2009 o tema é "A Festa Mágica do Mickey", por exemplo). Essa estratégia trouxe resultados muito positivos, com o número de visitantes aumentando ano após ano, até atingir o numero recorde de 2008.
A história da Eurodisney ilustra claramente as armadilhas que corremos quando não conhecemos profundamente os nossos consumidores, e mostra também os benefícios que conseguimos quando conseguimos entendê-los bem. Outro aspecto que fica muito claro é a dificuldade em obter esse conhecimento. Afinal de contas, apesar do aumento expressivo do número de visitantes, a Eurodisney continua deficitária. Seus executivos conseguiram entender bem como atrair mais pessoas para o parque. Mas ainda não conseguiram entender como fazer essas pessoas gastarem o seu dinheiro por lá.